Sirius: o acelerador de partículas brasileiro

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Ainda neste ano, um grande terreno em Campinas, São Paulo, começa a ser desocupado para dar início às obras de um dos maiores projetos científicos do Brasil: a construção do novo acelerador de partículas do Laboratório Nacional de Luz Síncroton (LNLS), batizado de Sirius. Sim, é isso mesmo que você leu: não apenas já existe um acelerador de partículas em solo nacional como também um novo, mais poderoso e preciso, deve substituí-lo dentro de alguns anos.

O projeto, liderado pelo físico Antonio José Roque da Silva, tem custo estimado de R$ 650 milhões e será patrocinado pelo Governo Federal, com apoio de empresas privadas que também desejem fazer uso das futuras instalações do Sirius. Com anel central de 500 metros de circunferência, o acelerador ocupará um prédio de 250 metros de diâmetro e atrairá pesquisadores do mundo todo, visto que será a única instalação desse tipo na América Latina e a segunda do hemisfério Sul a trabalhar com a luz síncroton.

Mas, afinal, para que serve esse tipo de luz?

Luz síncroton e a compreensão do mundo microscópico

A luz síncroton é uma radiação eletromagnética que abrange uma intervalo muito grande de espectros, indo do infravermelho ao raio X. Com ela, cientistas podem enxergar as estruturas atômicas e moleculares de diversos materiais, desde rochas e fósseis de dinossauros até células e compostos químicos.

Essa luz é gerada pela aceleração de elétrons dentro de um anel com mais de 500 metros de comprimento e a uma velocidade muito próxima da velocidade da luz (300 mil km/s). A princípio, serão 13 pontos de luz presentes no acelerador Sirius, o que permitirá que diversos profissionais façam uso simultâneo da máquina.

SOLEIL, fonte de luz síncrontton na França (Fonte da imagem: Reprodução/Wikipedia)

Em entrevista para o Estadão, Roque da Silva explicou que o acelerador síncroton é o equipamento ideal para entender materiais, tanto do ponto de vista estrutural quanto funcional. Com a luz emitida pelo Sirius, será possível descobrir quais átomos compõem determinada matéria, qual é a distância entre eles, como eles se interagem, quais são suas propriedades etc.

UVX, o acelerador atual do Brasil

A tecnologia não é nova e o Brasil já possui um acelerador de partículas como esse. Trata-se do UVX, que também está localizado em Campinas (SP) e em operação desde 1997. Em entrevista para a revista Science, o engenheiro e físico Ricardo Rodrigues, principal responsável pela criação do UVX, contou que, durante o desenvolvimento do projeto, apenas cinco cientistas brasileiros já haviam usado a luz síncroton em seus projetos. Hoje, o UVX atende mais de 1,5 mil pesquisadores anualmente.

Para a construção do equipamento, Rodrigues precisou contornar as dificuldades — como a falta de recursos financeiros e científicos — e contratou estudantes ou jovens cientistas e engenheiros que buscavam o primeiro emprego. Muitos aprenderam o trabalho na prática, e a inflação alta daquele período tornava proibitiva a possibilidade de importar peças de outros países. Como a indústria brasileira ainda não possuía a habilidade necessária para a construção dos equipamentos, Rodrigues e sua turma tiveram que construir tudo do zero, manualmente.

O UVX e o seu criador, Ricardo Rodrigues (Fonte da imagem: Reprodução/Science)

O UVX tem sido usado até mesmo por grandes empresas petrolíferas, como a Petrobrás e a Braskem. Porém, apesar de ainda ser muito útil, o equipamento está desatualizado, não podendo competir diretamente com aceleradores síncroton de terceira geração, como se propõe a ser o Sirius.

Em entrevista para a Agência FAPESP, Roque da Silva declarou que, para entender a diferença entre os raios X emitidos pelo UVX e pelo Sirius, “podemos comparar o feixe de luz de uma lanterna com o de uma ponteira a laser, que tem divergência muito menor”. O novo feixe de luz será capaz de criar o que os físicos chamam de raios X “duros”, capazes de penetrar em materiais muito mais espessos.

Como funcionará o Sirius?

O acelerador de partículas Sirius será mais de cinco vezes maior do que o UVX e muito mais potente: enquanto o acelerador de segunda geração trabalha com energia operacional de 1,37 bilhão de elétrons-volts (GeV), o novo equipamento será operado a uma energia de 3 bilhões de elétrons-volts. Com isso, o feixe gerado pelo Sirius terá um brilho muito maior, beneficiando a comunidade científica e proporcionando mais confiabilidade e novas aplicações.

Segundo o artigo publicado pelo Estadão, os elétrons a serem acelerados são gerados pelo aquecimento de uma liga metálica e, em seguida, enviados para o anel de aceleração, onde a partícula ganha velocidade antes de ser repassada para o anel principal. No principal, os elétrons viajam por tubos de vácuo a uma velocidade próxima à da luz, e suas trajetórias são conduzidas com a ajuda de mais de mil ímãs espalhados pelo caminho.

Esquema de funcionamento do SOLEIL, que é semelhante ao do Sirius (Fonte da imagem: Reprodução/Wikipedia)

Com trilhões de elétrons correndo por esses túneis, o feixe luminoso de luz síncroton é desviado para estações fora do anel principal, onde as pesquisas são efetivamente realizadas. Esses terminais possuem filtros capazes de modular a luz síncrona para o tipo de espectro que o pesquisador precisa, como raio X.

Sirius x LHC

É importante não confundir um acelerador com um colisor de partículas. Apesar de ter uma estrutura que, grosso modo, parece similar, o Sirius tem muito pouco em comum com o Grande Colisor de Hádrons, sendo que a principal diferença é o fato de que, no Sirius, as partículas não entram em rota de colisão.

Primeiros testes em 2016

Se tudo correr bem e o Governo Federal liberar a verba necessária para a construção do acelerador Sirius, os primeiros testes com o equipamento devem começar em 2016, junto com as Olimpíadas. Já o uso real da máquina teria início em 2017.

Modelo tridimensional de como serão as instalações do Sirius (Fonte da imagem: Reprodução/LNLS)

Para garantir que os R$ 650 milhões necessários sejam alcançados, o governo deve recorrer a parceiros que estejam interessados em investir no desenvolvimento do Sirius para que possam usá-lo no futuro. O projeto é 100% brasileiro, sendo que apenas alguns componentes serão importados, por não terem disponibilidade em solo nacional.

A presença de um equipamento como o Sirius no Brasil atrairá pesquisadores do mundo todo e o projeto já é considerado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Informação como estratégico para o país. Por enquanto, vamos torcer para que o Brasil conquiste mais esse desafio durante as Olimpíadas de 2016.

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